Vald Ribeiro
Daqui de longe vejo fotos da Bienal do Livro no Rio. Há pessoas com cara de felicidades por toda parte, muitas ostentam meigos souvenires de patinhos amarelos. Umas pessoas usam os patinhos como adereço na cabeça, outras como um broche no busto, há adolescentes que acondicionaram patinhos na mochila. Crianças e adolescentes com sorriso no rosto, mulheres sorridentes ou de fisionomia sisuda, homens com cara de comunista ou de roqueiro ortodoxo ostentam um patinho em alguma parte da roupa.
Achei a coisa mais linda do mundo ver tanta gente ostentando patinhos literários — assim são chamados esses mimos — e simultaneamente carregando sacolas e mais sacolas de livros na mão ou a tiracolo. Olhei em uma das fotos e vi que um patinho literário custa 10 reais. Se comprar três, paga-se 20.
Se eu tivesse na Bienal eu pediria vênia a minha moral anticapitalista e compraria um desses patinhos. Provavelmente o colocaria no ombro como aquele pirata que ostentava um papagaio no ombro. Os patinhos de mentirinha são belos como os de verdade. E neste contexto de Bienal, o que simboliza ter um patinho literário?
Fiquei por um tempo sonhando acordado: eu andando de um lado para outro visitando estandes, assistindo palestras com belo patinho amarelo no ombro. Imaginei muitas pessoas olhando para mim com meu patinho. Pessoas ali achariam a coisa mais normal. Então modulei meu sonho desperto: eu saindo da feira literária para pegar o ônibus, ou, se eu ficasse com preguiça, pegaria um táxi desses de aplicativo. Quem não soubesse da Bienal, ao me ver com o souvenir presilhado no ombro, acharia que eu seria um excêntrico. Eu andaria altivo enquanto algumas pessoas pensariam e falariam bem ou mal de mim. Alguns que entendessem o contexto do patinho, concluiria que meu souvenir é o Status Quo de alguém da classe média que esteve na Bienal e que eu sou um contumaz consumidor de livros. E essas pessoas, em efeito halo, se sentiriam contentes por ver alguém que foi a uma feira literária e comprou muitos livros e até mascote extraoficial do evento.
Por que desejo o patinho literário? Há falta de patinhos literários em minha vida? Se o desejo advém da falta… não, não sinto falta de um patinho literário… e seu estivesse lá e o comprasse eu estaria no grupo social do efeito manada. Eu seria mais um no rebanho do mundo capitalista em submissão clara ao consumismo e obediência aos valores capitais. Eu cairia como um patinho na lama pegajosa do consumismo. Se eu fosse a esse evento, e tivesse essa reflexão que tive agora, eu não pagaria o patinho literário, nem o pegaria; eu voltaria para casa apenas abarrotados de livros úteis.