Vi uma casa abandonada, na praia. Era de tudo um desprezo, um desperdício. Como pode uma casa a cinco minutos de uma praia sem ninguém dentro? Não resisti e entrei em seu espaço, já que o portão não mais segurava fechadura. O telhado da grande varanda despencava e o piso coberto de pedaços de telhas e madeira velha não me permitia notar se era de cerâmica, ardósia, porcelanato ou cimento. Era tudo um questionamento, uma decadência.
Ao fundo, uma área gourmet guardava resquícios de que houve uma última festa, com garfos e facas enferrujadas numa cuba de pia. Ao lado da churrasqueira um quartinho de bagunça com quinquilharias que não tive coragem de conferir, mas a cadeirinha de segurança de criança ainda estava lá. No outro lado da varanda uma grande mesa dessas que clamam por uma festa e mais adiante um freezer enferrujado segurava um saco empedrado de cimento e engradados de cerveja.
Tentei ouvir as vozes que passaram por ali, as famílias que se alegraram, as histórias, as piadas… Pensei na cadeirinha e achei que a última criança que chegou àquela casa veio de longe e se chamava Lavínia, uma menininha loira, com quatro anos, rica, filha única e que, nesse momento, deve ser uma médica renomada em algum lugar, seus pais moram no exterior e por isso deixaram aquele imóvel ao léu. O saco empedrado de cimento me fez lembrar que algo de muito terrível poderia ter acontecido para deixá-lo também sem função porque cimento me lembra reforma, desejo de melhoria. Lembrei-me da Pandemia e tentei justificar o abandono, mas aquele estado adiantado de desmoronamento precisou de mais tempo. Tempo que tudo arrasta lentamente.
Não quis dar lugar ao pensamento de tragédia, preferi acreditar na alegria e que aquela casa se encontra desprezada porque os donos a venderam para um investidor usurento que desistiu da reforma e deixou pegar preço. Pronto, assim fica mais fácil entender o desprezo, pois aquilo que não serve aos nossos interesses deve se tornar inútil.
Ao lado da casa, um pé de cacau anunciava a esperança, a singularidade da natureza, a renovação, o desejo de vida, a flor e o fruto. Nasceu por obra dos micos. Era uma planta nova que contrastava com a casa.
No fundo, nossas criações são assim mesmo, mas a natureza continua. Lá fora, o mar e o seu eterno ir e vir. Quando falei daquela casa abandonada e do meu espanto, as pessoas apenas disseram “tem muito mais por aqui!”
Como pode naturalizar o desprezo ou deixar uma casa sem pessoas dentro? Como pode uma casa abandonada numa praia? Eu quase tocava a tristeza da casa sem a sua função. Casa é, antes de tudo, personagem fundamental em minhas memórias, tristes e alegres. Jamais consegui vê-la como coisa porque é nela que habitam os nossos poemas, onde nos permitimos ser nós mesmos, intimamente. Uma casa numa praia é um convite para o repouso, para a festa, para amizade. Lamento muito se há muitas casas em condição de abandono porque construir algo para abrigar o vazio, especialmente numa praia, simplesmente não cabe em minha mente infantil.
Josué Brito Santana